"Amados, quando
empregava toda diligência, em escrever-vos acerca da nossa comum salvação,
foi que me senti obrigado a corresponder-me convosco, exortando-vos a
batalhardes diligentemente pela fé que uma vez por todas foi entregue aos
santos" (Jd 3).
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Originalmente,
Judas pretendia compartilhar com seus companheiros crentes as questões da fé
comuns a todos eles. Mas, o Espírito Santo o redirecionou a um assunto de
maior urgência. Questões da fé "uma
vez por todas... entregue aos santos" estavam sendo tanto sutilmente
solapadas como profundamente pervertidas. Hoje em dia acontece o mesmo que
naquele tempo. Todos os santos (isto é, cristãos – Ef 1.1; Cl 1.2, etc.)
devem batalhar diligentemente pelos ensinos da fé "dados por inspiração
de Deus" (comp. 2 Tm 3.16).
O que é batalhar
diligentemente?
Batalhar
diligentemente por algo não é uma atividade de
menor importância. A passagem paralela normal desse versículo é 1 Timóteo
6.12: "Combate o bom combate da
fé..." Em ambos os casos, o sentido é de trabalhar fervorosamente,
ou esforçar-se, como um atleta que irá participar de um evento esportivo. A
analogia do esporte oferece uma ilustração muito clara: bons atletas têm que
treinar com vigor para atender às exigências do seu esporte. Da mesma forma,
um cristão dedicado deve condicionar-se espiritualmente para atender à
exortação de Paulo: "Exercita-te
pessoalmente na piedade" (1 Tm 4.7). Paulo usou freqüentemente a
correlação entre os esforços dos atletas e o andar dos cristãos para mostrar
que a vida de um crente renascido não tem por objetivo a passividade. Ela
requer treinamento espiritual, que inclui muitas das qualidades demonstradas
por um atleta superior: diligência, dedicação, auto-disciplina, disposição de
aprender, etc. Entretanto, do mesmo modo como no cenário esportivo dos nossos
dias, muitos de nós se dedicam a ser espectadores – não necessariamente
"inativos", mas definitivamente não jogadores.
Muito freqüentemente a reação à exortação de Judas é dizer que é
melhor "deixar o batalhar pela fé para os especialistas", isto é,
para os estudiosos, os teólogos, os apologistas ou autoridades em seitas. Há
no mínimo dois problemas com tal idéia. Em primeiro lugar, as palavras de
Judas não foram escritas a especialistas em teologia, mas "aos chamados, amados em Deus Pai, e
guardados em Jesus Cristo" – ou seja, a todos os Seus "santos"
(Jd 1,3). Em segundo lugar, um dos principais aspectos da batalha pela fé
está relacionada com o desenvolvimento
espiritual de todo santo. Em outras palavras, batalhar pela fé não é
somente para especialistas em seitas, nem envolve necessariamente argumentar
ou confrontar os outros. Batalhar pela fé deveria ser o padrão de vida
espiritual de todo crente (comp. 1 Pe 3.15).
O desejo de estudar
diligentemente a Palavra de Deus
Batalhar diligentemente pela fé requer o desejo de estudar diligentemente a Palavra de Deus. Jesus
estabeleceu um programa de crescimento para todos que se entregaram a Ele: "Se vós permanecerdes na minha
palavra, sois verdadeiramente meus discípulos" (Jo 8.31). Em 2
Timóteo 2.15, Paulo acentua o exercício prático, diário, de todo crente: "Procura apresentar-te a Deus, aprovado,
como obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da
verdade." O coração do cristianismo é um relacionamento pessoal com
Jesus Cristo. Estudar e aplicar as Escrituras é a forma principal de
desenvolver nosso relacionamento pessoal com Ele; trata-se de conhecê-lO
através da revelação dEle mesmo.
A necessidade de
conhecimento
Batalhar diligentemente pela fé exige conhecimento. Não precisamos nos tornar especialistas antes de
compartilhar a "fé que uma vez por
todas foi entregue aos santos", mas devemos ser diligentes em nossa
busca do conhecimento do Senhor. Se bem que se tente fazê-lo muitas vezes, é
completamente insensato tentar batalhar por algo sobre o que não se está
informado. Salomão escreveu: "Filho
meu, se aceitares as minhas palavras, e esconderes contigo os meus
mandamentos, para fazeres atento à sabedoria o teu ouvido, e para inclinares
o teu coração ao entendimento, e se clamares por inteligência, e por
entendimento alçares a tua voz, se buscares a sabedoria como a prata, e como
a tesouros escondidos a procurares, então entenderás o temor do Senhor, e
acharás o conhecimento de Deus. Porque o Senhor dá a sabedoria, da sua boca
vem a inteligência e o entendimento. Ele reserva a verdadeira sabedoria para
os retos, e escudo para os que caminham na sinceridade, guarda as veredas do
juízo e conserva o caminho dos seus santos" (Pv 2.1-8).
A prática diligente do
discernimento
Batalhar pela fé requer a
prática diligente do discernimento. Em Hebreus 5.13-14 está dito: "Ora, todo aquele que se alimenta de
leite, é inexperiente na palavra da justiça, porque é criança. Mas o alimento
sólido é para os adultos, para aqueles que, pela prática, têm as suas
faculdades exercitadas para discernir não somente o bem, mas também o mal."
O "leite" e o "alimento sólido" desses versículos são
metáforas que se referem ao crescimento espiritual; limitar-nos a uma dieta e
a atitudes de crianças espirituais inibe nosso desenvolvimento espiritual.
Entretanto, os que exercitam suas faculdades pelo estudo da Palavra de Deus
crescerão em discernimento, não continuando "meninos, agitados de um lado para outro, e levados ao redor por
todo vento de doutrina, pela artimanha dos homens, pela astúcia com que
induzem ao erro" (Ef 4.14).
A disposição de aceitar
correção
Batalhar diligentemente pela fé exige que tenhamos a disposição de aceitar correção.
Corrigir, entretanto, não é um procedimento "psicologicamente
correto" em nossos dias, tanto no mundo quanto na Igreja. A correção é
considerada uma ameaça à auto-imagem positiva por muitos que promovem a
teologia humanista da auto-estima. É incrível como tal mentalidade mundana
influenciou fortemente aqueles que deveriam ser separados do mundo e cujos
pensamentos deveriam refletir a mente de Cristo. Mesmo uma pesquisa superficial
da Bíblia revela exemplos e mais exemplos de correção, que atualmente seriam
vistos como potencialmente destrutivos do bem-estar psicológico das pessoas!
Será que a "auto-estima" de Pedro foi psicologicamente danificada e
tanto sua auto-imagem como a imagem do seu ministério foram irreparavelmente
prejudicadas pela correção pública de Paulo? Foi o ministério de Pedro
considerado acabado pela maioria da igreja primitiva porque Paulo não foi
suficientemente sensível (ou, bíblico – deixando supostamente de considerar
Mateus 18) para ter um encontro particular com Pedro? Não é essa a maneira
como muitos na Igreja vêem as coisas atualmente? E o que dizer do trauma
sentido pelo ego dos publicamente corrigidos: Barnabé (Gl 2.13), Alexandre (2
Tm 4.14-15), Figelo e Hermógenes (2 Tm 1.15), Himeneu e Fileto (2 Tm
2.17-18), Demas (2 Tm 4.10), Diótrefes (3 Jo 9-10) e outros?
A correção é essencial para a vida de todo cristão. Em sua segunda
carta a Timóteo, Paulo orientou seu jovem discípulo a respeito do valor das
Escrituras para a correção (como também para a repreensão!), "a fim
de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa
obra" (2 Tm 3.16-17). A correção tem que começar em casa, isto é,
deve haver a disposição não somente de sermos corrigidos por outros, mas
também o desejo de corrigirmos a nós mesmos. A admoestação "Examinai-vos a vós mesmos se
realmente estais na fé" (2 Co 13.5) não pede uma avaliação pública;
ela requer que analisemos a nós mesmos e então façamos o que for necessário
para colocar as coisas em ordem diante do Senhor. Sem a disposição de
considerar a possibilidade de uma "trave" em nosso próprio olho, a
hipocrisia dominará em qualquer correção a outra pessoa.
Obediência às normas
Batalhar diligentemente pela fé requer obediência às normas. Enquanto alguns evitam praticar a correção
segundo as Escrituras, outros a usam como um grande porrete, dando com ele em
qualquer um que parecer não concordar com seus pontos de vista. As Escrituras
nos dizem que (no contexto dos galardões celestiais) aqueles que competem por
um prêmio serão desqualificados a não ser que sua conduta siga as normas do
evento (2 Tm 2.5). Isso também deveria ser aplicado ao modo como batalhamos
pela fé, especialmente no que se refere à correção mútua. A primeira e mais
importante norma é o amor. Correção bíblica é um ato de amor, ponto final. Se
alguém não tem em mente o interesse maior de uma pessoa, o amor não está
envolvido. Se o amor não é o fator
motivador da correção, o modo de agir não é bíblico.
A maneira como
nos corrigimos mutuamente é uma parte importante das "normas" da
batalha pela fé: "Ora, é
necessário que o servo do Senhor não viva a contender, e, sim, deve ser
brando para com todos, apto para instruir, paciente; disciplinando com
mansidão os que se opõem, na expectativa de que Deus lhes conceda não só o
arrependimento para conhecerem plenamente a verdade" (2 Tm 2.24-25).
Entretanto, uma repreensão severa também pode ser bíblica; nas Escrituras há
abundância de tais reprovações e repreensões Quando a situação as exigia. Mas
elas nada têm em comum com correção acompanhada de sarcasmo, humilhação,
ataques ao caráter pessoal ou qualquer outra coisa que exalte quem corrige ao
invés de ministrar àquele que está sendo corrigido. É irônico que o humor
dominante (TV, quadrinhos, etc.) dessa geração profundamente consciente da
"auto-estima", ego-sensível, seja o sarcasmo, especialmente a
humilhação. Fazer alguém se sentir inferior tornou-se a maneira preferida de
elevar a própria auto-estima.
Um teste simples de correção bíblica
é o nível de presunção por parte de quem a pratica. Se houver qualquer
indício dela – ele falhará. Outro teste rápido é o termômetro das
"maneiras desagradáveis". Se aquele que corrige trata os outros com
maneiras que ele mesmo não aceitaria – ele é parte do problema, não a solução
bíblica.
Conhecer pelo que se
batalha
Batalhar diligentemente pela fé envolve conhecer pelo que se batalha. Aquilo que envolve a subversão do
Evangelho, especialmente das doutrinas principais relacionadas com a
salvação, exige nossa séria preocupação e atenção. O livro de Gálatas é um
bom exemplo. Os judaizantes estavam coagindo os crentes a aceitar um falso
evangelho, isto é, adicionando certas obras da lei como necessárias para a
salvação. Paulo os repreendeu duramente, como também instruiu Tito a fazê-lo
(Tt 1.10-11,13). No mesmo espírito, argumentamos com os que promovem ou
aceitam um falso evangelho para a salvação (mórmons, adeptos da Ciência Cristã,
Testemunhas de Jeová e católicos romanos, entre outros).
Enquanto certas questões podem parecer não estar relacionadas com o
Evangelho, elas podem subverter indiretamente a Palavra de Deus, afastando os
crentes da verdade e inibindo dessa forma a graça necessária para uma vida
agradável ao Senhor. A psicoterapia, por exemplo, é um dos veículos mais
populares para levar os cristãos a buscar as soluções ímpias dos homens (e,
portanto, destituídas da graça).
Saber quando evitar
confrontos
Batalhar pela fé também requer que saibamos quando evitar confrontos. O capítulo 14 de Romanos trata
de assuntos em que a argumentação se transforma em contenda. Paulo fala de
situações em que crentes imaturos criavam polêmicas em torno de coisas que
não tinham importância. Alguns estavam provocando divisões por discutirem
quais alimentos podiam ser comidos ou não, ou quais dias deviam ser guardados
ou não. Nesses casos, o conselho da Escritura é: há certas coisas que não
devemos julgar, pois se trata de questões sem importância, que não negam a
fé, e são assuntos a serem decididos pela própria consciência (v. 5). Somente
o Senhor pode julgar o coração e a mente de alguém no que se refere a tais
assuntos.
Quando Jesus discutiu os sinais dos últimos tempos com Seus discípulos
no Monte das Oliveiras (Mt 24), o primeiro sinal que Ele citou foi o engano
religioso. Sua extensão atual não tem precedentes na História. Somente esse
fato deveria tornar nosso interesse em batalhar diligentemente pela fé uma
das maiores preocupações. Isso também significa que há tantos desvios da fé
(1 Tm 4.1) a serem considerados, que poderá ser necessário estabelecer
prioridades pelo que e quando vamos batalhar. No que se refere ao nosso
próprio andar com o Senhor, devemos examinar qualquer coisa em desacordo com
as Escrituras, fazendo as necessárias correções. Entretanto, quando se trata
de ensinos e práticas biblicamente questionáveis, sendo aceitas e promovidas
por outros, o discernimento pode também incluir a necessidade de decidir quando e como tratar deles. Atualmente, não é incomum ser erradamente
considerado (ou, de fato, merecer a reputação) como alguém que "acha
erros em tudo"; de modo que a busca da sabedoria e orientação do Senhor
é sempre essencial para que nosso batalhar seja recebido de forma frutífera.
Não devemos coagir
ninguém
Finalmente, batalhar diligentemente pela fé não é coagir. Muito freqüentemente esquecemos que recebemos nossa vida
eterna em Cristo como dádiva gratuita, uma dádiva do insondável amor de Deus
que deve ser oferecida aos outros em amor. O amor é destruído pela coação. Se
bem que nossa intenção pode não ser impor questões de fé aos outros, é
importante verificar regularmente nossos motivos e métodos. O batalhar
diligentemente pela fé deve ser realizado como uma oferta de amor. Temos que
lembrar que somos meramente canais de tal amor e que, se quisermos que ocorra
alguma mudança no coração, ela será realizada através da graça de Deus, a
única que garante o arrependimento (2 Tm 2.25-26).
Atos 20.27-31 contém alguns pensamentos que atualmente muitos iriam
considerar como desproporcionais
na batalha por "todo o desígnio de
Deus". Mas, trata-se das palavras de Deus, comunicadas apaixonadamente
pelo apóstolo Paulo aos membros da igreja de Éfeso e a nós: "Atendei por vós e por todo o rebanho...
Eu sei que, depois da minha partida, entre vós penetrarão lobos vorazes que
não pouparão o rebanho. E que, dentre vós mesmos, se levantarão homens
falando cousas pervertidas para arrastar os discípulos atrás deles. Portanto,
vigiai, lembrando-vos de que por três anos, noite e dia, não cessei de admoestar, com
lágrimas, a cada um."
Nestes "difíceis" tempos finais (2 Tm 3.1), ore para que
todos nós, como Paulo, demonstremos apaixonada preocupação pelo bem-estar
espiritual dos nossos irmãos e irmãs em Cristo e pela pureza do Evangelho essencial
para a salvação das almas (TBC 8/94).
T.
A. McMahon
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